Habilidades que as mulheres adquirem com a maternidade
Pesquisas comprovam: com a chegada dos filhos, desenvolvemos
uma poderosa cesta de competências que nos ajuda tanto em nosso crescimento
pessoal como profissional.
Isso mesmo! Podemos dizer que a maternidade traz um certo
upgrade para as mulheres. As pesquisas comprovam. Por exemplo: em um estudo
recente da Regus, consultoria especializada em flexibilizar ambientes de
trabalho, feito com 65 mil executivos mundo afora, nada menos do que 65% dos
entrevistados afirmaram que contratar mulheres com filhos pode aumentar a
produtividade, a criatividade e melhorar o relacionamento com os clientes.
Estudos científicos começam a mostrar por que isso acontece.
Um dos mais conhecidos foi conduzido pela neurocientista americana Pilyoung Kim
e publicado na revista científicaBehavioral
Neuroscience. Ela realizou exames de ressonância magnética do
cérebro de 19 mães em dois momentos: nas primeiras semanas após o parto e entre
o terceiro e o quarto mês depois do nascimento. Concluiu que há um aumento nas
áreas do cérebro ligadas a raciocínio, planejamento e julgamento. Segundo os
pesquisadores, esse fenômeno decorre de mudanças hormonais que ocorrem depois
do parto, como o aumento dos níveis de ocitocina, estrogênio e prolactina. Tudo
isso, claro, tem reflexos no comportamento da mulher.
Outro pesquisador que vem investigando esse assunto é o
professor de biologia Adam Franssen, da Universidade de Longwood, em Virgínia, nos
Estados Unidos. Sua tese é que as mulheres com filhos são melhores para
resolver problemas, lidar com o stress e completar tarefas que envolvem
memória. Para comprovar, tem desenvolvido com outros pesquisadores experimentos
com ratos — no caso, fêmeas divididas em dois grupos, as com e as sem filhotes.
Coloca os animais para realizar tarefas como orientar-se em um labirinto.
Depois, analisa amostras de seus tecidos cerebrais. Na prancheta, perguntas
como: será que a condição de mãe confere às fêmeas maior quantidade de
neurônios? Ou os neurônios maternos são mais eficientes do que os de mulheres
sem filhos? "Existem transformações nos neurônios", afirma Franssen
em uma entrevista à revista Smithsonian
Mag. "Eles aumentam de tamanho ou alguns potencializam sua
capacidade de produzir proteína em uma parte do cérebro ou talvez conectem
neurônios que não se conectavam antes", explica. Tudo isso, diz ele, para
dar conta da enorme carga de trabalho que é cuidar de uma criança.
Na própria pele
Formada em biologia, Ligia Moreira Sena, que escreve o
blog A cientista
que virou mãe, acompanha as descobertas da neurobiologia do comportamento
desde seus estudos de mestrado e doutorado. "Essa é uma parte da ciência
que investiga as áreas do cérebro que atuam em determinados comportamentos e
situações", explica. "Quando minha filha nasceu, passei a observar em
mim mesma muitas coisas que já havia estudado", conta ela, mãe de Clara,
hoje com 3 anos.
Ligia atua como moderadora de alguns grupos de mães em
Florianópolis e percebeu que o que aconteceu com ela também é vivido por outras
mulheres. "A neuroplasticidade é a capacidade de o cérebro se remodelar
mediante determinadas situações. A maternidade é uma delas. Ele se adapta para
que a gente consiga dar conta de muito mais coisas do que antes", explica
ela. Com um bebê em casa, a gente precisa ter uma atenção seletiva maior,
precisa estar focada nas atividades de cuidados com ele, mesmo tendo muitos
outros estímulos. Da mesma forma, pegar uma coisa tão frágil no colo exige mais
precisão de movimentos. "Isso sem contar coisas menos mensuráveis, como a
intuição mais aguçada, a atenção maior para pequenos detalhes", afirma a
bióloga.
Momento especial
Todas essas mudanças encontram terreno fértil para render
bons frutos. "Em geral, a gestação é um momento de introspecção na vida da
mulher, em que ela se volta para dentro, olha para si mesma. Na psicanálise,
dizemos que ela faz uma pequena regressão e entra em contato com uma linguagem
que a gente abandona quando cresce, a linguagem das emoções", observa a
psicanalista Audrey Setton Lopez Souza, professora do Instituto de Psicologia
da Universidade de São Paulo. "Nesse contexto, se a mulher se permitir,
vai descobrir que sabe muito mais do que imagina."
Para Stella Angerami, especialista em Counseling e Coaching,
sempre é tempo para aprender mais sobre si mesma. Especialmente quando a vida
traz um estímulo tão poderoso quanto o nascimento de um filho. Afinal, se
conseguimos realizar esse grande feito de gerar uma nova vida, podemos realizar
muito mais. "Temos mais ânimo para experimentar o desenvolvimento de um
novo comportamento, que antes ficava apenas no terreno da vontade", diz
Stella. "Com o tempo, a mulher se vê diferente, melhor, mais feliz consigo
mesma por ter conseguido transpor obstáculos que antes imaginava
intransponíveis." Por tudo isso, explica Stella, é muito comum que a nova
mamãe mude de comportamento e seja percebida social e profissionalmente assim.
Mesmo internamente, ela começa a refletir sobre suas necessidades pessoais e de
vida — incluindo anseios profissionais, comparações entre custo e benefício.
E como tirar partido de todas essas mudanças? "Primeiro,
ela precisa entender e aceitar que essas novas habilidades estão
presentes", observa Stella. "Depois, é importante refletir se delas
nasce uma nova ocupação pessoal e profissional ou se apenas podem aprofundar o
caminho que ela está seguindo e conquistar o que já tinha como plano para sua
vida", conclui Stella. Para ajudar nessa reflexão, apresentamos a seguir
algumas das principais habilidades que afloram ou são acentuadas depois que
temos filhos.
Organização
Logo nos primeiros dias com um bebê novinho em casa, a mãe percebe que ele tem um ritmo, que sua rotina precisa ser marcada por um ritual. "Ele necessita disso para se acalmar, para ir aprendendo a esperar", explica a psicanalista Audrey Setton. "E a mãe também vai se acostumando a lidar com essa rotina, a organizar sua vida e a da casa para integrar esse novo ser", completa. Um aprendizado importantíssimo, uma vez que, mesmo que conte com uma rede de apoio (empregada, babá, creche, marido, avós...), culturalmente é a mulher que gerencia o universo doméstico. Ver quem faz o quê, otimizar recursos, delegar tarefas. "Para tudo isso, ela tem de desenvolver ou aguçar o seu senso de organização, a capacidade de antecipar problemas e prever soluções para eles", explica a psicóloga Rita Caligari, do Hospital e Maternidade São Camilo, em São Paulo. Já pensou ter que sair de noite à procura de fraldas descartáveis porque esqueceu de planejar as compras desse item ou verificar se o estoque doméstico era suficiente? Se trabalha fora, também precisará aplicar esse senso de organização a suas tarefas no escritório para dar conta de tudo no tempo certo, sem precisar ficar além do horário ou levar trabalho para casa.
Gerenciamento do tempo
Para equilibrar seus muitos papéis, a mulher com filhos precisa fazer uma reengenharia de tempo. Em sua agenda, as mesmas 24 horas de antes têm que render muito mais para que possa atender a todas as necessidades da sua vida como mãe, mulher, amiga, filha, profissional... "E, muito importante, sem esquecer de reservar um tempinho para si mesma", diz Stella. "Esse respiro é fundamental para que ela dê conta das outras coisas."
Relacionamento interpessoal
Com filhos, a mulher acaba tendo que lidar com uma rede de relações maior — babá, empregada, funcionários da creche, professores... "Aumenta mais a exposição a situações em que tem que lidar com diferenças, conflitos. Essas experiências estimulam a habilidade de se relacionar com pessoas", entende Rita. Para quem lidera uma equipe no trabalho, é um aprendizado valioso. "A maternidade nos ensina a nos colocar no lugar do outro, a ter uma escuta mais sensível para suas necessidades e seus desejos. É assim que a mãe consegue distinguir o que o bebê está querendo dizer com cada tipo de choro", explica a psicóloga Ana Merzel Kernkraut, coordenadora do Serviço de Psicologia do Hospital Israelita Albert Einstein, de São Paulo. Essa sensibilidade nos relacionamentos interpessoais é cada vez mais valorizada no mercado de trabalho.
Flexibilidade
Quando um filho entra em nossa vida, temos que lidar com muitas situações pelas quais nunca passamos antes sem perder o centro. "Aumenta muito o número de variáveis que a mulher precisa gerenciar", diz Stella. Esse exercício, segundo ela, é ótimo para afiar seu jogo de cintura. Ela tem uma reunião importante no trabalho logo cedo e a empregada liga avisando que não vai conseguir chegar por causa da greve de ônibus. E agora? "São muitas as situações como essa em que ela terá que improvisar, encontrar uma saída à queima-roupa. Tudo isso é um treino que a torna mais flexível", observa Rita.
Criatividade
Como uma coisa puxa a outra, os imprevistos acabam aguçando outra habilidade: a criatividade para buscar saídas, alternativas e soluções que nunca tinha imaginado.
Foco no desempenho da tarefa
Como o tempo é escasso, para dar conta de tudo, saber focar no que é essencial é outra habilidade valiosa. "Com isso, ela faz uma vez só e bem-feito", diz Stella.
Iracy Paulina
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